segunda-feira, 25 de julho de 2011

Ei, passarinho!

Ei, passarinho! Leve este canto de amor para alguém
Que nunca entende o que quero dizer
Mas cuidado passarinho, está frio lá fora
Os gatos estão soltos
E os ratos são poucos

Ei, passarinho! Seja rápido e não erre de endereço
A noite corre solta, e logo o dia há de nascer
Que não recebam tarde demais, passarinho
O tempo é curto
A chama pode apagar

De nada adiantaria, passarinho
Apenas mais um conforto pr`essa alma solitária
Você sabe a verdade passarinho, camufle-a no seu canto
SOL DO RE RE FA
[eu te amo]

terça-feira, 19 de julho de 2011

Fantasmas

                Ele olhou-se no espelho: os primeiros fios brancos começavam a surgir; a pele, antes lisa e brilhante, enrugada e flácida; os olhos não tinham mais aquele brilho de outrora, hoje estavam de um azul aguado. Até o espelho demonstrava sinais do tempo: manchas negras destacavam-se no fundo prateado, a moldura começava a ficar frouxa. A mão tremula apertou o tubo do creme de barbear, espalhou no rosto e começou o ritual que repetia todas as manhãs desde os 15 anos: lado esquerdo, lado direito, queixo, bigode. Um corte, e o vermelho brilha entre o branco. Ele ainda estava vivo.
                Lentamente tira o pijama xadrez, e resolve sentir a liberdade com que viera ao mundo. Anda pela casa. Tudo ali lembrava a velhice. O tapete de azul ficara branco, os alumínios da cozinha estavam manchadas, os copos estavam engordurados, as plantas morreram, a cachorra estava cega, a pilha de jornal era uma constante que só aumentava. Aqueles jornais lhe traziam a dura realidade: seqüestros, morte, violência, poluição, o mundo não era o mesmo onde ele crescera.
                Repentinamente um par de olhos verdes o encara da parede. Aquele era o único pedaço de felicidade de sua vida, uma felicidade que brilhou em sua juventude, entre juras de amor eterno, findadas em três primaveras. Desde então não encontrou outros olhos, não encontrou mais calor. Os olhos verdes foram seu único amor. Não tinha filhos, perdera os pais. Restaram os vizinhos, que às vezes apareciam para o poker à noite, ou com um prato da torta saborosa. E, no armário, guardava a pesada farda azul.
                Abriu a janela, mas a lufada de vento quente e fumacento logo o fez fechá-la. Dirigiu-se a copa, serviu-se de um copo e encantou-se com o delicioso beijo dourado da moça de 18 anos saída daquela garrafa. A vida ensinara-lhe alguns prazeres. Nisso ele não poupara esforços, do drink no Moulin Rouge com a mais bela das moças ali presente até o bungee jump na Nova Zelândia. Tivera uma vida cheia, que, dentre outras coisas, rendeu-lhe o peso das medalhas em sua beca guardada no armário.
                A tosse veio, tinha chegado a hora. Passou por todos os cômodos da casa, como em um cortejo fúnebre era seguido pelos fantasmas de cada um dos salões: a cozinheira negra da cozinha, a moça de vermelho do seu quarto, a alemã do peito pequeno do banheiro, a ruiva da sala de jogos, a polaca do corredor, a professora loira da biblioteca e, o mais cruel de todos, os olhos verdes da sala. Foi até seu quarto e vestiu sua farda, a cada peça o incomodo da vida vazia aumentava mais. Até colocar a platina de quatro estrelas, completando o peso que era demais para seus fracos ombros de velho.
                Pegou um charuto cubano, acendeu-o e dirigiu-se ao banheiro. O Requiem de Mozart era um conforto a mais para seus cansados ouvidos. Encheu a banheira, testou a temperatura e entrou. A água quente confortava um pouco a dolorida tosse, ao mesmo tempo aumentada pela fumaça do charuto. Sua vida agora resumia-se naquela chama vermelha, um olho do demônio na escuridão quente do banheiro, em meio aos acordes de violino e às exaltações do coro.
                Lembrou-se da infância, dos poucos amigos, das noites regadas a álcool e sexo, das vitórias no ar, das promoções (que sempre vinham com um exercito de ombros invejosos). Havia pensado em algo mais doloroso, estava enganado. Era limpo e quente. Contou uma a uma as medalhas que portava no peito, todas as glórias da sua vida estavam ali resumidas. O cortejo fantasmagórico que o acompanhava estava cada vez mais real. A chama do charuto já chegava ao fim. Mais uma tossida, e a mão ficou cheia de muco vermelho.
                Os brilhantes olhos verdes oferecem-lhe um lenço. Estendeu sua fraca mão, tremula ao tentar romper a distancia. Conseguiu tocar aquela pele pálida. Choque. Não existia o calor de suas lembranças juvenis, a maciez aveludada. Ele toca um frio vazio. O contato não he trouxera o momento de felicidade ansiado. Dá a última tragada no cigarro, o peito enche-se de fumaça quente, pesada. Encara as duas esmeraldas a sua frente e fecha os olhos na esperança de voltar a sentir o calor naquela pele pálida. A chama do charuto apaga. A dor acaba.

domingo, 17 de julho de 2011

"Elipses (Meu. Eu.)"

Vi, era sim! Estava lá com seu mesmo sorriso, com a mesma maneira de andar dos ombros e com seus olhos que falavam por si. Dois anos se foram pelas antigas montanhas, mas ainda era. Agora (no ninho), com a mesma fantasia impecável, o azul bebê combinava-se com o barateia para formar sua armadura.
O brilhante acima da cabeça realçava ainda mais o contraste de sua pele, mas combinava muito bem com o branco da camisa de baixo – o mesmo branco que tentara pôr em si mesmo para esconder suas penas negras. Aquelas que eram retiradas com dor, pintadas como for.
Estava feliz, tinha conseguido conquistar seu símbolo – a pequena adaga dourada. Sorria com um ar de vitória, chegou onde não conseguiram. Não conseguiram , mas podiam, queriam, mas não foram. E estava lá, em meu lugar, somente esperando um brilho mostrar-lhe que, um dia, já foi. Se foi.
Mas o riso era mais do que isso, trazia a angústia de lembrar que não mais podia olhar e escutar sua voz.  Não estava ali para estar por cima, olhando de longe e escondido, desejando sempre mais...
Passou rápido como uma flecha, agora era um espírito do passado esquecido. – “O abraço não é seu” -. Era dos patos originais, brancos e perfeitos, os mesmos que vieram daquelas montanhas. Abraçados estavam, brincando as glórias com os outros, e era um pontinho preto, cinza, marrom, mas nunca alvo.

E aqui , só pensando:

“ Vai realizar o sonho que não pude.O sonho que não pude. Não pude. Não.”

ps. Por Luis Fernando Gonçalinho, do Manual de Quase Tudo http://manualdequasetudo.blogspot.com/

terça-feira, 12 de julho de 2011

TIQUE-TAQUE

TIQUE-TAQUE
O tempo vai engatinhando
Não quer passar, vou me arrastando
O remédio começa a fazer efeito
O gesso vai dando seu jeito

TIQUE-TAQUE
O tempo vai engatinhando
Na lama vou me arrastando
Ainda é terça-feira e pé cheio de bolha
A mochila pesada cheia de trolha

TIQUE-TAQUE
Sexta-feira que não chega
O coração desacelerando devagar
A vontade imensa de alcançar
Desejo que não desassossega

TIQUE-TAQUE
Sexta-feira que não chega
Tem sobrevivência, nós e orientação
Para achar um rumo, não no mapa
Afogar a vida numa adega

PS. Rimas e tédio juntos produzem coisas desastrosas...

sábado, 9 de julho de 2011

Chocolate

Não gosto de chocolates brancos, eles são muito meigos, tentam agradar demais.
Já o chocolate ao leite não tem personalidade, é o comunzão.
Por isso prefiro o chocolate amargo, eles são fortes, impõe sua identidade.

“- Ei, Nemo!”

Pois não...

“- Coisas não se comportam como pessoas.”

Que pena, achei que a recíproca também fosse verdadeira.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Ferrugem

Repudio agora o que me tornei,
Aliás, minto, tenho ódio ao que sempre fui.
Não consigo entender esta porra que chamam de vida!
Não consigo entender o porquê de acharem que com vocês foi sempre pior.
Não se dizem os melhores? O poder?
Então aguentem as consequências!
Querem ser eternos...
Não conseguem proteger a chama da imortalidade sequer da mínima garoa!
Repudio esta ferrugem que os corroí,
Aguentem a barra, não é pior que o peso do mundo.
Diferentemente das fênix, saibam que patos não ressurgem das cinzas.
Patos apenas voam, alto, em busca da sua liberdade...
Parem de grasnar, abram suas asas e voem para seus ideais!
Esqueçam os outros, lembrem-se de si.
Cuidado, pequeno Narciso, seu reflexo pode quebrar o espelho...

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Batatas

            Certa feita havia onze tribos rivais, que competiam por um lugar ao sol. Três seriam as eleitas. Não existiam meios para que todas sobrevivessem, era matar ou morrer. Mas não seria uma guerra armada, talvez com exceção de uma tribo blindada e uma uniformizada.
            Dois longos meses duraram o conflito: trabalho árduo, queremismo, desejo ardente por derrotar os inimigos um por um e, numa tarde ensolarada, estender ao sol sua bandeira. A guerra era cansativa. Havia intrigas internas, externas, prejuízos, dificuldades.
            Após o preparo, o teatro de operações estava armado. Claro, uma ou outra pequena batalha rompeu-se no calor dos preparativos, resolvidas rapidamente. O curioso era que o povo invasor seria o aliado. E a estratégia não era atacar o inimigo, senão agradar ao invasor.
            Cada tribo foi duramente invadida: eram questionadas, obrigadas a expor sua cultura, criticadas, elogiadas, e, conforme o objetivo inicial, foram eleitas. Cumpriu-se o objetivo. “Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas." [e a toda a humanidade as palmas por não entenderem um objetivo divergente da vitoria]

domingo, 3 de julho de 2011

Até Breve!

                De repente os juramentos foram por terra... E nada mais tinha valor a não ser a vontade de revê-la. Quanto tempo seria necessário ficar ao seu lado? Creio que se eu passasse o resto da eternidade com você ainda não seria o suficiente. Mas uma coisa eu sei: as duas horas ao seu lado foram as melhores que vivi nos últimos anos!
                Ahh... Como foi bom novamente rir seu riso; poder ficar parado, e, em êxtase silencioso, apenas admirar seu sorriso; ter aqueles momentos de extrema falta de graça ao não saber o que falar; encontrar uma velha amiga e ter uma conversa como se fosse novamente um pré-adolescente nervoso e apaixonado [talvez não pré-adolescente, mas o resto de fato sempre estive].
                Como você mudou: está mais madura, seus cabelos cresceram, a faculdade te fez extremamente bem. E eu, ah, eu estou aqui perdido nesse mundinho fechado. Cada vez pior, mais velho, fechado, um arquivo-morto. Talvez eu seja um tolo ao supor que você um dia poderia querer algo de novo comigo, aliás, nem sei como você aceitou da primeira vez.
                Mas as coisas boas da vida são tão rápidas quanto um piscar de olhos, e, mais cedo do que eu esperava você se foi. Não sei quando te verei de novo, não sei sequer se a verei de novo... Não sei ainda por que não tive a coragem de olhar para trás para ver você pela última vez naquele dia, talvez eu estivesse com medo daquilo se tornar de fato uma despedida.
Apenas fiquei ali, feito criança esperando o papai Noel, com o coração acelerado e a mão suando, gelada.  E torcendo por aquele “Até breve!” ser a coisa mais verdadeira que já ouvi na vida.