Não sabia exatamente como havia
chegado até ali: tantas portas o
deixaram ali, e os machucados ao chocar-se em tantas outras fechadas o
lembravam que era como impossível refazer todo o caminho. Na verdade ele não
sabia sequer o que estava sentindo. Havia mágoa, e como havia mágoa. Um gosto
de biles inundava a garganta à mínima menção daquele nome. Mas havia amor. Um
sorriso por uma mera lembrança, um amargo sorriso de rasgar o coração. Seria
esse o preço a se pagar pelos seus erros? Algumas bocas custam caro, e um beijo
pode sair mais pesado que o pote de ouro no fim do arco-íris. Gemidos então,
arranhões. São apenas dor e sofrimento - maquiados perfeitamente de prazer
naquela hora, aquela maldita hora em que os olhos se fecham e a respiração acelera.
Mas já tinha feito a aposta. Sabe-se lá por que motivos, talvez por instinto,
talvez por luxúria. E, eventualmente, sabia que podia perder. Na verdade tinha
perdido, a certeza da perda assolava-o mais forte a cada noite. Seu coração era
um pantomineiro dilacerado a contar bromas para uma plateia alegre. Porém, ele
tinha que ser forte. Forte como uma rocha, mais forte que o esmalte amarelado dos
dentes que lhe sorriam. Mais forte que as palmas que soavam da plateia após seu
espetáculo. Podia chorar, lágrimas arrancavam risos e mais barulhos, seus
expectadores eram cegos demais para perceberem seu pranto, lágrimas eram parte
de suas diversões ocas. Sabia que teria sido mais fácil sumir, perder-se na ilusão
e fechar os olhos para a vida. Só que era tarde demais para voltar atrás, havia
se perdido nas curvas do caminho, e retas eram apenas aqueles pontos onde saia
correndo tentando fugir do que estava por vir. O que estava por vir? O vazio,
perder-se no vazio. Mas antes tinha mais uma porta aberta em sua frente, e mais
uma, e, sem perceber, cruzou-as, seguiu adiante. Era isso: ser forte ao expiar
seus erros, sorrir ao ver a próxima porta fechada, entrar sem pensar nas
abertas... não há volta!
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